Barca do Lago |
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Os princípios e origem do aparecimento desta milagrosa imagem da Mãe de Deus, referem-se num livro antigo manuscrito (ainda hoje se conserva) que foi assinado e rubricado por um tal Pedro de Couros Carneiro e pelos juizes do quadro das freguesias de S. Miguel de Gemeses, S. Martinho de Gandra e Santa Eulália de Palmeira.
Conta-se no citado livro que no tempo em que o corpo do Padroeiro das Espanhas, o Apóstolo S. Tiago, passou pelo mar de Matosinhos, onde se verificou aquele célebre milagre das vieiras e conchinhas, e donde foi aportar, na mesma barca em que levaram os seus discípulos, ao lugar e sítio do Padrão, no reino da Galiza, e onde se começavam logo a mover os cristãos, que habitavam terras de Portugal, a irem visitar o Santo Apóstolo. As terras daquelas freguesias eram muito montanhosas e estéreis naquele tempo. O rio Cávado era muito perigoso para a passagem dos muitos romeiros. À vista deste trabalho, resolveram os moradores daquelas freguesias , juntamente com o piedoso cavalheiro Pedro de Couros Carneiro, que era o senhor da freguesia e lugar de Palmeira, construir uma barca para nela poderem passar gratuitamente todos os passageiros e peregrinos, a toda a hora, tanto de noite como de dia, ricos e pobres, por amor de Deus. Esta é a barca que chamam «Por Deus» ou «Do Amor de Deus».
Vendo estes devotos instituidores de tão caritativa obra que o concurso de peregrinos e pobres era muito grande, muito mais sobressaiu neles a caridade, porque edificaram, naquela mesma passagem, um hospital para nele recolherem e agasalharem os pobres passageiros e peregrinos. Assim se foi continuando neste santo e piedoso uso, pelo espaço de muitos anos, até que foi crescendo mais o numero de gente e se viam muito mais frequentadas aquelas estradas.
Neste tempo , movida a misericordiosa Mãe dos pecadores, sem dúvida não só louvando tão piedosa obra, como também movida da Sua piedade, quis manifestar-se naquele sítio, para também com a Sua presença, por meio duma Sua imagem, assistir e favorecer uns e outros. O lugar onde a senhora apareceu já não se sabe hoje. Podia ser que fosse a alguns pescadores que, lançando as suas redes ao rio, fizessem tão grande lanço que colhesse nelas a soberana Rainha dos Mares. Não seria esta a primeira vez que esta grande Senhora, para pescar os pescadores, quis ser presa nas redes e sair do mar, para os livrar do profundo mar das culpas, e porque este rio, naquele lugar, devia ser muito profundo, por isso lhe dariam o nome de rio Cávado.
O aparecer a senhora e ser pescada no mar, o vimos na maravilhosa invenção da imagem de Nossa Senhora da Graça do Seu convento de Lisboa, a qual tiraram presa numa rede uns pescadores de Cascais.
È esta soberana imagem da Mãe de Deus de escultura de madeira, tem quatro palmos de estrutura e tem seus braços o Menino Deus. E não podia deixar de trazer consigo aquele misericordioso Senhor, para continuamente lhe rogar pelo alívio e remédio dos pescadores: a uns, para que os remediasse e livrasse dos perigos, e a outros para que lhes remunerasse o grande trabalho e caridade com que tratavam dos pobres peregrinos.
Descoberta e manifestada esta preciosa pérola naquele rio e achada na concha daquele pego ou lago, lhe deram os moradores daquele lugar, (por não lhe saberem a própria invocação) o título de Nossa Senhora do Lago, ou da Barca do Lago, como que fazendo-a principal Piloto daquela barca, para que assim ficassem muito seguras as suas viagens, e livres de perigos os que nela embarcassem; e sem duvida a mesma Senhora lhes devia inspirar que lhe dessem este titulo, porque, como Ela é a Senhora dos Mares e dos Rios, Ela mesma quis santificar aquele, para que com sua manifestação cessassem de todo os antigos perigos que havia naquele profundo lago e ficasse, daquele dia par sempre, lago da Mãe de Deus e lago feliz e santificado.
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